quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Com excesso de turistas, Ilha Grande terá tarifa de barcas mais alta e estuda controle da visitação

A Ilha Grande ficou pequena para a quantidade de visitantes que vem recebendo nos últimos anos. Num domingo de sol do verão passado, chegaram a desembarcar 20 mil pessoas no local, quase o dobro da população de lá, calculada em 12 mil moradores. Nesse dia da semana, o fluxo de turistas tem sido intenso até mesmo na baixa temporada. Alguns culpam a redução do valor da passagem das barcas, depois de um período de tarifas elevadas. Outros responsabilizam operadoras de turismo, que levam passageiros para a ilha com embarcações velozes e horários frequentes. O fato é que a população e autoridades já estudam como impor um limite à visitação, nos moldes do sistema adotado em Fernando de Noronha, onde há um rígido controle de acesso.



O subprefeito da Ilha Grande, Ivan Marcelo Neves, faz o alerta:

— Estamos diante de uma bomba-relógio que pode explodir no próximo verão.

Uma iniciativa do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) mostra que a preocupação com o paraíso ecológico não é de hoje. Há dois anos especialistas estudam a capacidade da infraestrutura do lugar, para fazer o ordenamento turístico e definir o modelo de gestão. O trabalho está em fase de finalização e foi acompanhado por representantes das comunidades locais, da prefeitura de Angra e do governo estadual.

Autoridades municipais também já estão agindo. A Fundação de Turismo de Angra dos Reis (TurisAngra), por exemplo, em conjunto com as prefeituras de Mangaratiba e Paraty, vai cadastrar até novembro as embarcações que partem dos três municípios levando visitantes à ilha. São tantas que fugiram ao controle. A ideia é limitar o número de barcos.

A presidente da TurisAngra, Sílvia Rubio, acredita que, só em Angra, cerca de 200 escunas ofereçam passeios à Ilha Grande:

— Vamos estabelecer um número máximo de embarcações, que receberão um selo de turismo legal.

Engenheiro sanitarista, o subprefeito diz que primeiro é preciso tornar os serviços públicos eficientes:

— Abraão, Araçatiba e Provetá são as regiões mais adensadas. Abraão, por exemplo, tem esgoto canalizado e jogado no emissário, a um quilômetro de distância, mas não é tratado. Nossa oferta de água também tem limite. E, apesar de todos esses problemas, estamos recebendo uma demanda gigantesca (de visitantes), sem comando e sem controle.

Comerciantes dizem ainda que o perfil do turista mudou.

— A maioria dos turistas passa o dia, não consome nada no comércio e vai embora sem levar o lixo — reclama Aglais Siqueira Bego, de 54 anos, dona de restaurante na Vila do Abraão há 20 anos.

A Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos de Transportes (Agetransp) autorizou a volta, em 6 de setembro, da cobrança da tarifa turística, suspensa em 2012. Em qualquer dia da semana, os turistas que fizerem de barca os trajetos Mangaratiba-Ilha Grande e Angra-Ilha Grande pagarão R$ 14, em vez dos R$ 4,80 atuais. A agência atendeu ao argumento das prefeituras de Angra e de Mangaratiba, segundo as quais, após a suspensão da tarifa mais alta cobrada nos fins de semana, a visitação ficou desordenada. De acordo com a Agetransp, entre março e dezembro de 2012, houve um aumento de 42,5% no número de visitantes. Moradores e trabalhadores da ilha, com Bilhete Único, viajam de graça.

A superlotação não agrada aos moradores. Jeferson da Silva, de 50 anos, nascido na ilha, diz que o lugar não tem condições de receber tanta gente:

— Tem esgoto vazando nas praias do Abraão, onde os turistas mergulham sem saber desse problema. Primeiro, precisamos melhorar as condições do lugar, para depois receber os visitantes.

Outros problemas surgem com a superlotação. Moradores e comerciantes contam que recentemente um homem foi preso ao assaltar um turista. Além disso, o comércio reclama da proliferação de ambulantes ilegais em Abraão.

— É um turismo predatório, que não traz divisas e deixa muitos problemas — diz o subprefeito.

Valdir Siqueira, presidente do Conselho Para o Desenvolvimento Sustentável da Baía da Ilha Grande, também defende a ideia de se fixar um limite de visitantes, como em Fernando de Noronha, mas ressalta as diferenças:

— Fernando de Noronha é mais fácil de controlar porque a maioria dos turistas chega de avião.

Para Sandro Muniz, diretor do Parque Estadual da Ilha Grande, a situação exige mesmo medidas mais amplas que aumentar o valor da passagem da barca:

— O projeto de ordenamento turístico visa a melhorias na comunidade. E ordenar não significa proibir. Ordenar é distribuir melhor o turismo na ilha. Determinadas praias já estão no limite, principalmente na capacidade de fornecimento de água e coleta de esgoto.

(O Globo)