Sabidamente a Carta Magna contempla três disposições alusivas à periculosidade. O artigo 7º da CF (Constituição Federal) de 1988 estabelece que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de Saúde, Higiene e Segurança; o adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei, e a proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de 18 anos e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos.
Na primeira disposição alusiva à periculosidade, tem-se patente o direito fundamental dos trabalhadores urbanos e rurais brasileiros à minimização dos riscos ocupacionais, suficiente para ensejar o corolário correspondente ao dever patronal de propiciar a seus empregados ambientes de trabalho sadios (isentos de agentes nocivos à saúde) e seguros (desprovidos de agentes danosos à integridade física). Na segunda, garante-se aos empregados o direito à percepção de adicionais de insalubridade, penosidade ou periculosidade sempre que o ambiente laboral possibilitar efeitos deletérios à saúde ou à integridade física, respeitados os ditames da legislação específica. Na terceira disposição constitucional, vê-se expressa a proibição do trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de 18 anos, o que é compreensível ante o dever social maior de se velar pelo desenvolvimento saudável do adolescente que necessite trabalhar.
No plano da legislação infraconstitucional, cabe recordar que, desde a edição da Lei nº 6.514, de 26 de dezembro de 1977, modificadora dos artigos 154 a 201 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e atinentes à Segurança e Saúde Ocupacional, os explosivos e os inflamáveis eram os dois únicos agentes legalmente possíveis de caracterizar a periculosidade, conforme disposto no então vigente artigo 193 da CLT. Com o advento da Lei nº 7.369, de 20 de setembro de 1985, surgiu no mundo jurídico-laboral o terceiro agente periculoso: a energia elétrica.
Quanto às normas infralegais pertinentes à periculosidade, o primeiro destaque cabe à 16ª Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho: NR 16 - Atividades e Operações Perigosas que, em seus dois Anexos (1 - Atividades e Operações Perigosas com Explosivos, e 2 - Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis), disciplinou o artigo 193 da CLT. Em seguida, coube ao Decreto nº 93.412, de 14 de outubro de 1986, regulamentar especificamente a periculosidade decorrente dos riscos de contato com a energia elétrica, em atenção aos ditames da Lei nº 7.369/85.
Todavia, com a publicação da Lei nº 12.740, de 8 de dezembro de 2012, restou patente uma nova e atual redação do artigo 193 do Código Obreiro (veja Quadro 1, Atividades perigosas), evidenciando a determinação legislativa de reunir neste único dispositivo legal todas as possibilidades juridicamente válidas de tipificação do exercício periculoso, no âmbito da relação empregatícia.
Importante enfatizar que o caput do referido artigo expressamente delegou poderes ao MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) para regulamentar as atividades e operações perigosas com os agentes tipificados no inciso I (explosivos, inflamáveis e energia elétrica) e no inciso II (roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial), sempre observados dois requisitos: "risco acentuado" e "exposição permanente".
A conceituação precisa de "risco acentuado" e "exposição permanente" tem desencadeado inúmeras controvérsias técnico-jurídicas. Logo, espera-se que o órgão regulamentador seja prudente e objetivo na definição desses dois termos técnicos, de modo a minimizar e a prevenir eventuais conflitos de interpretação. Em princípio, "risco acentuado" pode ser entendido como a capacidade diferenciada de uma grandeza com potencial elevado para causar lesões ou danos à saúde ou à integridade física dos trabalhadores. Enquanto "exposição permanente" pode ser considerada a que se manifesta de forma habitual e significativa, ou seja, de forma comum e rotineira no exercício profissional diário, mas não necessariamente durante todas as horas da jornada laboral.
A propósito da regulamentação da periculosidade resultante de risco acentuado e exposição permanente a explosivos e inflamáveis, não há dúvida de que os Anexos 1 e 2 da NR 16 permanecem em pleno vigor, dada a persistente sintonia com os ditames atuais do artigo em análise.
No que diz respeito à regulamentação da periculosidade resultante de risco acentuado e exposição permanente à energia elétrica, convém destacar que a Lei nº 12.740/12 expressamente revogou a Lei nº 7.369/85 e, por conseguinte, deve ser tida como igualmente revogada sua regulamentação (Decreto nº 93.412/86), em respeito ao consagrado princípio jurídico de que "o acessório segue o destino do principal". Não obstante, para não prejudicar o direito adquirido dos que já percebem adicional de periculosidade pela energia elétrica, há de se entender, de forma meramente circunstancial, que especificamente o Quadro de Atividades/Área de Risco do aludido Decreto deve persistir como válido até a edição da nova regulamentação normativa.
Fonte: Revista Proteção