quinta-feira, 9 de maio de 2013

Transporte público defasado gera críticas diárias entre os cariocas

Um estudo recém-publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), baseado em dados gerados pelo IBGE, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, mostra que quem vive na Região Metropolitana do Rio leva 44 minutos e 18 segundos, em média, no deslocamento casa-trabalho, enquanto que, em São Paulo, o trajeto médio demora 44 minutos e 42 segundos. A diferença de 24 segundos aparece nos dados de 2011, mas os pesquisadores Rafael Henrique Moraes Pereira, do Ipea, e Tim Schwanen, da Universidade de Oxford, descobriram, ao analisar as informações de 1992 para cá, o que cariocas já desconfiavam há tempos: em alguns períodos, os moradores do Rio superaram os paulistas nas horas perdidas até chegar ao emprego. Em 2008, por exemplo, levaram em média 44 minutos e 30 segundos, enquanto que, em São Paulo, foram gastos 42 minutos e 42 segundos.

O mesmo estudo demonstra que, assim como a praia carioca é democrática na hora do lazer, os momentos de sofrimento dentro de carro, metrô, ônibus, barcas ou trem também não escolhem classe social: os 10% mais ricos da população levam, em média, 39 minutos e 12 segundos até a porta do trabalho, pouco menos do que os 10% mais pobres, que desperdiçam 40 minutos e 24 segundos (dados de 2009).Para entender por que está difícil para todo mundo ir de um ponto a outro, basta saber que, ao contrário de outras metrópoles, o Rio nunca investiu muito no transporte sobre trilhos — e agora está pagando a conta. Inaugurado em 1979, o metrô carioca tem apenas 35 estações, enquanto o de São Paulo, aberto cinco anos antes, tem 62. Um pouco mais longe, os exemplos também demonstram que a cidade sofre pela falta de investimentos: em Buenos Aires são 86 estações; em Paris, 300; e em Nova York, 468.

Sem rede, e com apenas duas linhas, o metrô do Rio leva somente 5,5% do total de passageiros. A maior parte da responsabilidade fica com os ônibus, que, ao transportarem cerca de 70% dos moradores, atravancam as ruas com 12 mil veículos, contando os coletivos municipais e os que têm ponto final na capital. As vans, que ajudam a tumultuar o tráfego, fazem 17% dos deslocamentos. Para embolar de vez o trânsito, há o aumento da frota de carros: nos últimos três anos, mais 225 mil saíram às ruas do Rio. O resultado dessa equação são um nó no trânsito e uma insatisfação generalizada, que especialistas dizem ser urgente resolver.

Embora o Rio esteja agora começando a correr atrás do prejuízo — com a construção da Linha 4 do metrô, que vai chegar até a Barra, e a criação de corredores expressos para ônibus, os BRS e os BRTs —, usuários reclamam que, mesmo com novas soluções, o desconforto não acabou. O analista de sistemas Danilo Dinelli, que usa o BRT Transoeste para ir de Guaratiba, onde mora, à Barra, onde trabalha, diz que a viagem, que antes levava uma hora e meia, demora hoje 35 minutos, no ônibus expresso, ou uma hora, no parador. O que continua igual é o sufoco:

— Muitos ônibus já estão com o ar-condicionado quebrado. A solução é abrir a janela de emergência para ventilar um pouco. O BRT vive lotado, viajo espremido. Na volta, no Terminal Alvorada, tem duas filas. A de quem quer viajar sentado, e que é obrigado a esperar cinco, seis ônibus, e a de quem quer ir em pé. Melhorou, mas não muito.
Para Miguel Bahury, ex-secretário municipal de Transportes e ex-presidente do Metrô, as mudanças que o Rio está fazendo na área são incompletas. Segundo ele, uma das medidas fundamentais para desafogar o trânsito e melhorar a mobilidade urbana seria construir a Linha 4 original do metrô, que passava pelo Jardim Botânico:

— A ligação Estácio-Carioca-barcas também deveria ser retirada do papel. Além disso, é preciso recuperar o transporte ferroviário. Em 1984, os trens chegaram a transportar 1,2 milhão de pessoas — diz Bahury, que chama a atenção também para a falta de planejamento. — Tiveram que fechar agora duas estações do metrô porque a General Osório não foi pensada como uma estação de expansão, e sim terminal.

Diretor da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), William de Aquino defende que, além de melhorar o transporte, com maior oferta de trens e ampliação da rede do metrô, é preciso tirar carros da rua. Para isso, vale apostar em soluções radicais:

— Em Cingapura, quando você compra um carro, tem que entrar num leilão para obter a placa e acaba gastando com ela o dobro do valor do veículo. Além disso, em Londres, paga-se pedágio ao chegar à área central. Essas medidas desestimulam o uso do carro. Pode-se pensar em algo parecido por aqui. Se você fecha ruas e restringe locais de estacionamento, também consegue retirar carros das ruas.

Vice-presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-Rio), Fabiana Izaga diz que uma das soluções é ter uma gestão metropolitana dos transportes:

— Hoje, os ônibus são municipais, e o metrô é concessão estadual. Tem que existir um órgão que congregue tudo, organize melhor o sistema.

Diante de tantos dilemas, o professor de Engenharia de Transportes da Coppe Paulo Cezar Martins Ribeiro diz que é preciso chamar os universitários:

— Precisamos fazer uma grande reflexão com governo, pesquisadores, sociedade, empresas de consultoria. Se a frota continuar crescendo do jeito que está, em 2019 teremos um carro para cada dois cariocas. Como planejar a cidade para isso? Se não pensarmos todos juntos agora, nem sei como poderá ser daqui em diante.


Fonte: O Globo