quinta-feira, 16 de junho de 2011

Pesquisa estuda formas de recuperação do solo contaminado por metais pesados

Em 2008, só no estado do Rio de Janeiro, 12.089.739,85 toneladas de resíduos foram despejadas pelas indústrias e pelos processos de extração de minérios, segundo dados do Instituto Estadual do Ambiente (Inea). Nas sociedades contemporâneas, completamente dependentes do progresso, o lixo do desenvolvimento gera diversos problemas de saúde à população, além de causar danos ao meio ambiente. Contudo, como a responsabilidade socioambiental está em alta, medidas que minimizam essa poluição estão, cada vez mais, sendo adotadas pelas empresas. Wilma de Carvalho Pereira Bonet Guilayn, pesquisadora do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental, da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), aposta na reintegração natural de áreas contaminadas por metais pesados, induzindo a atenuação da poluição, bem como o reaproveitamento econômico da região condenada.


"Desde 2001, com recursos de um convênio entre Fiocruz e FAPERJ e de outras instituições, venho estudando a dinâmica e a composição química de solos contaminados por metais pesados, a fim de propor um modelo de gestão que reintegre a área contaminada ao sistema produtivo", explica Wilma. "O que buscamos é conseguir reestruturar o solo para que certas espécies de plantas consigam se desenvolver", complementa. "A proposta seria estabelecer um tipo de cultura agrícola, que além de atenuar a poluição, atendesse somente à indústria, gerando renda e emprego. Como o cultivo de mamona para a produção de biodiesel", conclui.
Segundo Wilma, o projeto se desenvolveu graças ao apoio de outros grupos de pesquisa. "Fizemos importantes parcerias ao longo desses anos, como o auxílio do Departamento de Geografia e do Departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além da ajuda do Instituto de Agronomia e do Departamento de Solos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e do apoio do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem), entre outros".

Ela conta que a motivação do estudo foi perceber que algumas regiões contaminadas por metais pesados ficam sem supervisão, o que aumenta o risco da população próxima fazer uso da área para cultivo de alimentos ou criação de animais. Além disso, exposto à ação das chuvas, o solo contaminado sofre lixiviação – processo que movimenta elementos do solo, disseminando-os para o lençol freático e para as bacias hidrográficas. Somado a isso, a ação dos ventos também contribui para a dispersão dos resíduos para áreas adjacentes.

Quando os metais pesados se incorporam ao ecossistema, são absorvidos por vegetais e animais. O maior problema é que esses elementos são bioacumuláveis, ou seja, se acumulam nos seres vivos, que são incapazes de eliminá-los. Em níveis elevados, eles se tornam extremamente tóxicos ao organismo, causando diversas doenças, como lesões nos rins, no fígado, e problemas no sistema nervoso central.

A pesquisadora informa que seu objeto de estudo foi o passivo ambiental da Companhia Mercantil e Industrial do Ingá, que encerrou suas atividades de extração de zinco há mais de vinte anos. No início do projeto, Wilma fez a exploração da área e encontrou altas concentrações de metais pesados – como zinco, cádmio e chumbo – e ao estudar esses resíduos constatou que apresentavam características ácidas, o que deixa esses elementos mais móveis no solo. "A partir desse conhecimento, investimos na idéia de diminuir a acidez, acreditando na hipótese de reduzir a mobilidade do solo e assim retardar o processo de disseminação dos metais pesados", diz.
Para isso, Wilma levou para o laboratório, além de amostras desses resíduos, os rejeitos provenientes da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que também haviam sido estudados por ela e que apresentavam características alcalinas. Com os dois materiais, ela montou diversos modelos experimentais, simulando diferentes combinações. "O objetivo era chegar a uma disposição que fosse menos nociva ao ambiente, ou seja, que ficasse mais neutro, diminuindo a mobilidade dos elementos contaminantes", diz.
De acordo com a pesquisadora, o modelo mais eficaz foi a mistura dos resíduos de metais pesados com os rejeitos alcalinos, disposta sobre um tipo especial de argila – com elevada capacidade de absorver água e baixa permeabilidade. "Nesse modelo, observamos uma ‘cimentação’ natural, que diminui a infiltração da água e a mobilidade dos elementos no solo, o que, na prática, poderia frear a lixiviação", explica a pesquisadora.

Na etapa atual, Wilma estuda a adição de materiais orgânicos aos solos contaminados da região da Ingá. "O objetivo é formar um substrato, que proporcionasse os nutrientes necessários às plantas e promovesse a estabilidade dos elementos", explica Wilma.
O solo contaminado é acrescido de biossólido – lodo retirado da estação de tratamento de esgoto da Fiocruz e tratado para retirada de microorganismos patogênicos. A adição do biossólido além de deixar o solo mais capaz de desenvolvimento vegetal, pode contribuir para atenuar a poluição. "No experimento, já foram observadas bactérias capazes de obter energia a partir da oxidação de compostos inorgânicos, como os minerais que potencialmente contém metais pesados", acrescenta.

Nesse substrato obtido em laboratório, foram plantadas algumas espécies vegetais a fim de testar sua eficácia. "Buscamos saber se com a utilização desse "solo", será possível pôr em prática uma espécie de sucessão vegetal, ou seja, o desenvolvimento natural das comunidades de seres vivos, o que significa que aquele ecossistema se sustenta", explica a pesquisadora. "Para isso, a planta tem que crescer e formar raízes, que serão analisadas para constatar se houve ou não absorção de elementos potencialmente contaminantes do solo", complementa.

Wilma ressalta que a ideia é encontrar espécies vegetais que consigam se desenvolver nesse modelo de solo e que atendam à indústria, a exemplo das plantações de mandioca e de mamona direcionadas para a produção de etanol e de biodiesel, respectivamente. "Atualmente, há diversos destinos para os resíduos, como incorporá-lo ao cimento ou isolá-lo totalmente", diz. "A nossa proposta é implementar a regeneração da área contaminada e reintegrá-la economicamente à região", destaca.

Wilma acredita que o estado do Rio de Janeiro esteja voltando a ser um pólo industrial. "E como não há indústria sem resíduo, torna-se ainda mais importante definir medidas socioambientais sérias, que visem o reaproveitamento e o processamento dos resíduos industriais", sem esquecer do solo, que é o que sobra, quando toda as atividades cessam, conclui.


Fonte: Elena Mandarim, FAPERJ