Quatro de julho, feriado nos Estados Unidos e Mark Blatt, clínico geral, estava em plantão cobrindo a ausência de 12 médicos, de uma clínica, em meados dos anos 90. Naquele sábado de verão, Blatt – hoje diretor global de vendas da área médica da Intel – atendeu cerca de 200 ligações em um intervalo de quatro ou cinco horas.
“As minhas costas doem”. “Meu filho está resfriado e não para de chorar”. “Eu estava cortando a grama do meu jardim e agora minhas pernas estão coçando muito”. Oitenta por cento dos telefonemas durante a madrugada apresentavam reclamações desse tipo. Encaminhar tais pacientes ao pronto-socorro em um dia de desfalque não era a decisão mais adequada a ser tomada. “Comecei a fazer algumas questões-chave aos pacientes e percebi que com as perguntas certas, eu conseguia cuidar de 70% ou 80% das pessoas por telefone”, relembra o executivo que atualmente estuda como a Tecnologia da Informação (TI) pode viabilizar melhor assistência aos cidadãos e custo-benefício aos prestadores.
Em uma segunda-feira comum, ligações como essas seriam interceptadas pelas secretárias dos consultórios e se tornariam consultas. Em geral, o paciente tiraria meio dia de folga no trabalho para ir ao médico, ser examinado e receber, basicamente, a mesma resposta que Blatt tanto deu naquele feriado de independência americana.
“E foi quando eu comecei a me perguntar o que estava fazendo no meu consultório. Eu estava desperdiçando o tempo e o dinheiro das pessoas. O paciente tem de pagar U$ 100 por consulta, tirar licença no trabalho e ir até o consultório para ouvir o que poderia ouvir em 90 segundos por telefone de onde quer que esteja”, afirma o diretor, evidenciando o quão burocrático e custoso ainda é a prática da medicina no mundo.
Entretanto, passados duas décadas, a tecnologia se mostra apta para revolucionar o modelo assistencial vigente e a mobilidade é a grande propulsora dessa tendência. Países como China e Inglaterra são exemplos de como as informações de saúde podem estar integradas e armazenadas na nuvem. Para Blatt, o Brasil está no momento de arquitetar a entrega de melhores serviços de saúde com a TI.
“Naquele plantão, imagine o que eu poderia ter feito se tivesse acesso ao histórico dos pacientes por meio de registros eletrônicos na nuvem e ainda a possibilidade de realizar uma videoconferência”, relembra Blatt, que mudou radicalmente a maneira de pensar ao longo dos anos. A sua escolha pela profissão foi influenciada por um programa de televisão da década de 70, protagonizado pelo médico americano Marcus Welby, que cuidava dos avós, filhos e netos de uma mesma família.
O método de Welby é claramente insustentável nos dias atuais e o executivo garante que estão disponíveis tecnologias seguras para grandes transformações; resta, agora, vontade política e mentalidade aberta aos médicos e demais profissionais. “A ideia é que o histórico do paciente exista na nuvem e que o médico consiga acessá-lo via tablet ou outros dispositivos móveis”, explica.
Sistemas de monitoramento e pacotes de imagens também na nuvem são outras tecnologias complementares à assistência remota que, segundo Blatt, possibilitam a transição por dados e histórico do doente durante a consulta. “Posso ver imagens de exames completos e ir passando de uma coisa para outra. E, em vez de apenas falar com você, eu posso iniciar uma sessão Skype e ter todas essas janelas abertas ao mesmo tempo. Seria ótimo se fossem integrados, se fossem só um sistema, mas podemos começar com sistemas separados”, relata o executivo, que enfatiza a importância da criptografia dos dados que estão na nuvem e da autenticação do usuário para manter a segurança.
A promessa da tecnologia, de acordo com o diretor da Intel, é atender mais de 60% da demanda de forma ágil e menos custosa, o que diminui a necessidade de construir clínicas e hospitais; como o caso da Suécia, que teve quase a metade dos hospitais fechada nos últimos dez anos devido a implantação de um sistema de registros médicos na nuvem.
Havaí - Com respaldo legal, empresas de seguro saúde no Havaí oferecem consultas online de dez minutos para todos os cidadãos por US$ 25 ou US$ 35, caso seja necessário um especialista. “Eles também devolvem seu dinheiro se o médico não conseguir resolver seu caso e você tenha que passar por consulta pessoalmente”, conta Blatt.
EUA - As empresas de seguro-saúde americanas estão mostrando interesse pelo uso da computação fora da estrutura hospitalar, porque o custo de entrega do serviço pode ser reduzido. Já existem empresas no País que, sustentadas por anúncios de propaganda, oferecem gratuitamente o armazenamento de registros eletrônicos na nuvem.
Outro modelo é a cobrança mensal, por médico, para utilizar os dados na nuvem. “Depende de como os médicos querem receber seus dados. Eles podem comprar um aplicativo, carregar no tablet e rodar em um servidor na nuvem. Eles também podem usar aplicativos baseados na web e pagar um preço diferente. Ou ainda comprar um software por US$ 10 mil e carregá-lo em dispositivos móveis”, explica.
Inglaterra - Na Inglaterra, os médicos são responsáveis pela compra de hardwares e softwares e, assim, disponibilizam os dados na rede nacional conhecida como Spine. Todos estão na mesma rede de e-mail, a maior do mundo, com cerca 1,7 milhão de membros, o que possibilita que um médico no extremo norte do país consiga marcar uma conversa com um especialista em Londres em tempo real.
China - A China possuía 1,2 milhão de médicos tratando 800 milhões de pessoas e, para resolver essa disparidade, o governo chinês investiu, em 2008, na estruturação de uma rede, distribuiu computadores móveis a milhares de moradores de vilarejos e treinou seus médicos para atendê-los.
Fonte: Saúde Web